A Ana Emília é muito mais que uma vizinha! É uma amiga, uma irmã, uma confidente.
Um dia contou-me que Jean Paul Satre, quando ela era bem mais nova, e o seu sorriso ainda era despreocupado e sem melancolia, em amena tertúlia poética e filosófica, lhe chamou de Estrela. Eu não sou o Satre, nem nada que se pareça, mas partilho da sua opinião. A Ana Emilía é também para mim uma estrela que, embora em tristes céus de noites de Inverno se esconda, está sempre lá.
Quando lhe contei que tinha alugado uma casa ficou radiante. Disse-me que queria dar-me tudo o que daria a filha, caso o infortúnio da vida, não a tivesse levado para um lugar, presumo, muito mais bonito que este!
“O que te falta ?” – perguntou-me.
Queria dizer-lhe que me falta tudo. Queria dizer-lhe que estou triste por chegar às lojas e limitar-me a olhar para as coisas bonitas… porque não as posso comprar.
Mas não disse!
Respondi: “Falta-me um sofá, um esquentador e uma TV.”
Qual o meu espanto quando ao fim de alguns dias me apareceu com uma TV, novinha em folha! Nem queria acreditar.
A seguir à TV, foi uma torradeira, uma espanta-espíritos em madeira lindíssimo, um carrinho para a cozinha (daqueles em que se arruma tudo-e-mais-alguma-coisa.), uma caixa para o esparguete entre outras coisas rodeadas de muitas palavras meigas e de incentivo.
Na sexta-feira passada contei-lhe que ia tirar os candeeiros que tinham sido deixados pelos inquilinos anteriores. Tal como a decoração dos anos 70 deixada para trás, também os candeeiros eram de cores medonhas!
Perguntou-me: “Que vais fazer aos candeeiros?”
“Vou mandá-los fora”- respondi tristemente. “Não gosto mesmo deles!”
“Não mandas nada fora!” – Disse-me rispidamente. “Eu conheço um fulano de uma loja de antiguidades que te compra os candeeiros”.
Mais uma vez surpreendeu-me pela ajuda incansável que me dá.
Resumindo: Vou entregar-lhe os candeeiros e em troca ela oferece-me o esquentador!
A Ana Emília é mesmo uma estrela. É a minha estrela do Norte.
Cada vez que penso que os amigos me escapam por entre os dedos como se de areia se tratassem, lá aparece ela, com o seu cigarro ao canto da boca e com a voz rouca dos anti-depressivos e pela falta de dormir um sono descansado há já vários anos, que me reconforta e que me chama de parva da forma mais carinhosa que conheci até hoje!